(Aguenta lá esses olhos na minha cicatriz porra! aí mesmo, no canto da boca)
porque o mundo burguês, pá, só se aproveita dos trabalhadores para enriquerecer pá...
(foca-te no meu movimento corporal... mais um pouco e já caíste)
porque os cinco tostões que ganhas são só arrotos da burguesia
(repara na minha mão a tocar subtilmente no cabelo seboso de gordura proletária)
porque as vítimas dos regimes fascistas...
(fixa o meu modo de aconchegar o sexo por cima das calças)
porque a gente pá... unidos pá venceremos esta burguesia filha da puta controladora do capital
(então não é desta pá... pronto, pronto... mais um movimento... observa como cruzo a minha encharpe palestiniana pelo pescoço)
Porque a malta não está unida pá porque dispersa-se em lutas pequenas pá que não nos levam a parte nenhuma, pá a luta pá é só uma... só uma..
(encontro os teus olhos nas minhas tenis rotas... pá... não está a dar resultado.)
E unidos venceremos...
[Depois da reunião do grupo de trabalho...]
- Dolores, fiquei enojada com o Manuel Zebedeu.
- Então camarada? porquê? que pensamentos são esses? olha que vou comunicar ao comité central!!! Não pode ser ... estás a aburguesar... a nossa missão... pá... a nossa missão[...]
(Deixei a Dolores em Santos e vagueio sozinha pela margem deste petróleo aquático unido por uma ponte... estou sozinha...)
Hoje, 31 de Janeiro de 1976. vinte e oito anos, quatro meses, seis dias. Conto a idade como contas de um longo rosário. O tempo pesa-me nos ombros... amanhã acordarei para o morno dia da manhã. Da fábrica ficou o que não encontrei...
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